Já faz meio ano então, que todas as coisas mudaram. Depois de três anos da mesma rotina, do mesmo cotidiano; acordar 5:30, banho, ônibus, escola, ônibus, casa, estudar, dormir... Depois de tanto fugir da rotina: seus olhos chilenos, o sotaque carioca, um jornal, o prédio antigo, máquina de costura, máquina de escrever, panfletagem, manifesto ao fim do mundo, revolução? Revolução!
Acabou, claro. E lá estava eu de mala e cuia, livro, roupa, Frida, mochila, tudo que eu ia chamar de meu, inclusive o coração que ganhei aos 18 anos, ajeitando tudo em um quarto novo, pequeno, e meu. Meu. Era a minha vida agora, e exclusivamente minha, sem responsabilidades com mais ninguém, e obviamente, sem ninguém para comigo.
O notebook se tornou um grande amigo; minava as distâncias com alguns cliques; Campinas, Botucatu, Taubaté, São Carlos, Marília, Santos, tudo ali perto, escutando a vozes de vocês. Claro, não é e nunca será a mesma coisa. A mesma coisa daquelas tardes na nossa praça, cantando hakuna matata, ou dos finais de simulado no colégio com nosso mapa da América Latina e os calculos mirabolantes de economia.A mesma coisa das nossas festas de aniversário (ninguém nunca mais saberá fazer surpresas tão boas!), a mesma coisa de tanto amor que é pra sempre e que nada muda. E a gente sabe que isso vai além de qualquer piegismo, porque é verdade.
Não nego que estou feliz, que eu sou feliz. Abro as janelas do quarto e vejo a Paulicéia ainda sonolenta, bocejano, mães arrastando pela mão seus filhos para irem à escola, o café e sua fumaça cheirando por todos os lados, e lá no canto de tudo o céu se abrindo em v e eu pensando em contar para vocês o que é que é isso, e como é que é isso. A minha felicidade de agora, não anula a nossa felicidade de ontem. Entendam.
Se estou bem em São Paulo? Demais, claro. Não tenho nenhuma reclamação do gênero; ó meu Deus, como é difícil lavar minha roupa e fazer minha comida, como é infernal a USP, ou São Paulo. Não são todos os dias tranquilos, também. Vezououtra a gente acorda querendo ver algum rosto familiar, ver alguém para te dizer 'Minha Ana!', vezououtra a gente acorda querendo um afeto muito maior que o Mundo. Mas vezououtra a gente acorda e pensa 'crescemos, enfim', vezououtra a gente sai com os colegas e se diverte, vezououtra a gente já acha que pode jurar que tem um presente bem bonito, completo e colorido. Vezououtra...