quinta-feira, 23 de julho de 2009

Não há ninguém na linha

Acordava com dores no corpo e olhava o teto do quarto, o gosto ainda na boca, só teve forças para virar a cabeça e vomitar no chão toda a noite, ou toda sua evasão como chamava. Queria escutar beatles, mas a vitrola estava quebrada, o apartamento sem energia elétrica.
Pisou no chão, tirou a blusa, limpou o vomito e jogou-a no box de banho. Fugiu do espelho, não queria ver a própria silhueta, desistiu de achar uma peça de roupa limpa na bagunça toda.
Queria poder ligar para ela
, mas não posso, nem pelo telefone é mais que ela não me atenderia, ou atenderia? Dane-se, não faz diferença.
Acabou o café, acabou o pó, o leite azedou, os morangos estavam mofados na geladeira e ela tinha gastado as últimas economias com a bebedeira e com aquela caixa maldita de morangos fora de época, queria comer com ela, mas ela não veio, pensava, às vezes, se não era apenas uma invenção.
Não, ela existia. Suas fotos estavam no espelho, teria de encará-lo para vê-la, e já não foi assim que a perdi?olhando para mim mesma e me descobrindo?
Ligou o chuveiro, a água gelada agora lavava o vomito da noite anterior e a fazia vomitar novamente, mas não tinha forças para párar de fazê-lo. Não ia lavar a cabeça, daria só mais trabalho.
Vestiu sua roupa limpa de cabide, passou o resto da sua maquiagem adolescente no rosto e foi à rua. Poderia se abandonar no desfiladeiro, mas não há poesia em morrer na marginal, se bem que completaria meu gosto horrivel de viver sempre a margem.
-Moço, mais uma dose.