terça-feira, 10 de março de 2009

A Seara de Saramago; José Nêumanne Pinto.


Esta língua é minha semente,
machado de mulato do morro,
pátria de poeta lisboeta.

Esta língua é minha visão,

o sol do soldado caolho,
a mão do soldado maneta.

Esta língua é minha música,

na palavra do padre pregador,
no pássaro do padre voador.

Esta língua é minha mulher

tem cuidados de mãe
no leito da amante.

Esta língua é minha rosa,

tem perfume dos sertões gerais,
tem sabor de vinhos do Porto.

Esta língua é meu cavalo

para subir cidades e serras,
que a brisa do Brasil beija e balança.

Esta língua é fel com mel,

cantigas a palo seco
de ninar o futuro.

Esta língua é meu coração,

na tortura, na paixão
e no sal amargo da purificação.

Esta língua é jóia africana,

ela caça a onça caetana,
ela cruza a légua tirana.

Esta língua é fruto de meu ventre,
mata sede de amizade,
me arma nos bons combates.

Esta língua não é de viver,
língua de navegar e de lamber
e de dançar o tango argentino.

Esta língua é meu berço,

esta língua me conhece,
esta língua é meu caixão.